terça-feira, 26 de maio de 2009

quintal

O meu quintal é maior que o mundo, ela leu, de algum poeta. Pensou que aquela frase poderia ter sido sua, quando era mais nova. Quando acreditava mesmo que a vida inteira cabia num quintal. Pensava hoje quem seria, depois de tanto tempo. A vontade de ficar naquele trabalho de merda, tanto esforço mental pra ficar ali, para quê exatamente? Não se lembrava mais. Sabia que era por alguma coisa. Tanto tempo para ser alguém, esse alguém que perguntam sempre, antes de qualquer outra coisa, quando nos conhecem – mas você faz o quê? Trabalha em quê? No esforço de responder-se pelo que faz, construiu-se boa parte da vida para trabalhar ali, sentada naquela mesa de tampo rosa, em frente àquele computador de merda, achando que o mundo andava conforme seu mouse, fazendo todos os esforços possíveis para continuar ali, sentada, distante do seu quintal.

Seu quintal era maior que o mundo e o seu mundo, agora, era uma titica de nada. Uma mesa, o computador. O dia escurecendo pela janela estreita. Alguns cigarros do lado de fora, nos minutos em que se dava o tempo de fumar. O esforço para estar numa vida da qual, quando leu a frase do poeta, pensou em fugir.

Mas ficou ali. Porque não adiantava nada mesmo querer mudar coisa alguma.

(Carla Kinzo)

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